segunda-feira, 12 de julho de 2010

Como parecer rico em Carlos Barbosa - dicas e truques

Depois de ler alguns parágrafos de alguns livros sobre "como atender bem os clientes" resolvi acreditar que também posso escrever um desses tratados e ficar rico. O público, claro, poderá preferir entender que se trata de uma brincadeira. Entretanto, reza a lenda que toda a brincadeira tem um fundo de seriedade. Não sei, mas segue um esboço do tratado. Ficaria mais ou menos assim:

Como parecer rico em Carlos Barbosa - dicas e truques:

Utilize o carro para absolutamente tudo o que for fazer fora de sua casa. Mesmo que o carro seja do seu pai, que o combustível seja pago pelo pai, assim como o seguro, o imposto e o DVD novinho que você acabou de instalar. Vá de carro, mesmo que seja para ir à padaria que está a vinte metros.

Quando for à padaria, nunca compre somente o pão. Saia do estabelecimento com, no mínimo três sacolas. E lembre-se de deixar algumas compras aparecendo por cima da sacola. Isso é chique. Jamais compre seus pãezinhos em estabelecimentos que forneçam sacolas feias.

Se não puder estacionar exatamente em frente à porta do estabelecimento, abandone o carro no meio da rua com o pisca-alerta ligado. Quanto mais caro for seu automóvel, maior o efeito produzido.

Jamais saia da vídeo-locadora com menos de oito filmes, mesmo que você só tenha tempo para assistir a um. Se houver uma fila razoável, lembre-se de pedir para a atendente um Godard. Mesmo que você não entenda porra nenhuma dos filmes dele, diga que você o ama.

Nos restaurantes, procure falar alto e gesticular bastante (certifique-se de não haver comida nos talheres antes de gesticular). Procure falar mal de quem está presente. Na hora de pagar a conta repita o valor anunciado de modo que todos saibam o quanto você gastou. Procure pagar com notas de cem ou cinquenta reais. Jamais saque da carteira notas de cinco ou dez reais (isso é coisa de boteco).

Evite que as pessoas o vejam comprando carteiras ou cintos daqueles vendedores ambulantes que vivem em frente à Santa Clara.

Economize uma grana durante o ano para ir ao Festiqueijo. Depois, fale mal do evento até não aguentar mais e, no ano seguinte, vá novamente.

Jamais viaje de ônibus (exceto se você for um aluno da UCS ou da Unissinos).

Assine a revista Veja e utilize os argumentos cientificamente comprovados da revista para falar mal do Lula. Somente do Lula. Se o presidente já for outra pessoa, continue falando mal do Lula.

Vá ao cabeleireiro toda a semana. Cabeleireiros que cobram menos do que R$ 25,00 para fazer qualquer coizinha são, na verdade, barbeiros. Barbeiro é coisa de velho pobre e aposentado. Evite.

Se você trabalha no escritório da Tramontina, lembre-se sempre de dar uma volta no Café Brasil depois do expediente, mas vá com aquela camisetinha azul-claro com a logomarca da empresa no peito (aquela que você está usando para trabalhar desde segunda-feira). Isso dá muito status, mesmo que você ganhe menos que muito peão da produção.

Lembre-se de ir ao café portando, além do uniforme, o crachá. Mas utilize-o pendurado no pescoço com uma fitinha azul. Prendê-lo no bolsinho da camisa com aquele prendedorzinho é coisa de plebeu.

Quando for às compras, leve consigo o seu filhinho e deixe-o colocar no carrinho tudo o que ele quiser. Se você não puder pagar, retire as coisas do carrinho sem que a criança perceba e abandone-as em qualquer prateleira.

Troque a cozinha de sua casa, no mínimo, a cada dois anos. E quando o fizer, coloque trocentas fotos da sua novíssima cozinha no Orkut.

Sorria sempre. Mesmo sem ter vontade. O sorriso forçado é até mais charmoso e mais fotogênico. Se você tiver que optar entre a cirurgia de hemorroidas e o clareamento dental, opte pelo segundo. Afinal, não passamos de um tubo digestivo com um cérebro numa extremidade e uma cueca na outra. Cuide melhor da extremidade que as pessoas veem e que comporta o cérebro.

Enfim, poderíamos escrever dúzias de páginas sobre cada item, sobretudo esse último (do tubo digestivo), por isso acho que poderíamos escrever um ótimo tratado. Umas duzentas páginas com gráficos e ilustrações. Seria um sucesso na feira do livro e no supermercado. Certamente iria contribuir para tornar as pessoas mais felizes.







4 comentários:

  1. "Não passamos de um tubo digestivo com um cérebro numa extremidade e uma cueca na outra".

    Interessante reflexão! hehe!

    Seu texto nos mostra uma realidade deprimente de nosso município, fruto desta imagem fantasiosa que se criou em torno das cidades serranas como "um refúgio europeu em meio ao caos do terceiro mundo".

    Para manter esse status vale tudo. Frequentemente somos obrigados a ouvir, de alguns dos nossos munícipes mais influentes, um discurso que remete a necessidade de promovermos uma higienização social, evitando que se instalem em nossa "Dinamarca" seres humanos que não sejam dignos de serem iluminados pelo mesmo sol que nos ilumina.

    É só parar para ver o burburinho que tem gerado os conjuntos habitacionais construídos com recurso do Minha Casa Minha Vida.

    Ridículo!

    Viva a soberba de nosso povo medíocre!

    Abraços Cede, e parabéns pelo texto!

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  2. "Não passamos de um tubo digestivo com um cérebro numa extremidade e uma cueca na outra".

    Essa imagem não é exatamente minha. Devo ter lido isso em Machado de Assis (não tenho certeza). Só acrescentei a cueca...

    Sim, esse é o discurso da região serrana. Você falou em "pessoas influentes" defecando esse discurso, então lembrei-me da sessão da Câmara de Vereadores de ontem (12-07). Um nobre edil, em seu discurso inflamado, relinchou elogios rasgados à fiscalização do poder público que, em pleno domingo, acabou com o "barulho" produzido por alguns indígenas que vendiam cestos de vime na Rodoviária. O que não faz um Festiqueijo?
    Qualquer dia eu deixo de ser brocha e começo a citar nomes, hehehe...

    Grato pela leitura e pelo comentário.

    Abraços!

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  3. Cede, não tenho o dom da palavra, mas expressaste exatamente grande parte de nosso povo. Faltou mencionar os carros com o som a todo volume rodando em círculos no centro nos finais de semana, será que isso tambem é status? Colega, adoro polêmicas.
    Mela

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  4. Oi Cedenir, gostei da forma como você escreve. Este é o segundo texto seu que leio. Vou ler mais e mais e mais ... seu teclado associado às suas ideias são uma promessa. Um abraço. Neusinha.

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