sexta-feira, 21 de maio de 2010

Desafios da Igreja para o novo milênio

Se você ainda não ouviu as pérolas do arcebispo de Porto Alegre, Dom Dadeus Grings, veja aqui. Há também vídeos no YouTube, mas dá muita raiva. Talvez ler seja melhor do que ver. O estômago do leitor irá decidir.

Indo direto ao ponto: como pode Dom Dadeus, uma pessoa "culta" e "letrada", fazer afirmações tão absurdas? Ele diz que a "liberalização" da sexualidade gera desvios de comportamento, mas esquece de especificar quais são esses desvios. Parece que ele se refere à pedofilia (que ele mistura com homossexualismo, revelando a sua ignorância sobre o assunto); mas, para nós, que observamos a Igreja pelo lado de fora, parece que "desvios de comportamento" refere-se aos comportamentos que a Igreja impôs (e impõe) ao longo dos séculos, e não dos comportamentos naturais do ser humano. Na verdade, um dos papéis mais recentes da Igreja foi o da institucionalização do sexo. Ela quer institucionalizar as relações e a reprodução. É isso que nos ensinam na escola, na catequese e em casa (pelos pais, através de uma ferramenta cristã que se chama "poder familiar"). Para fazer sexo (e consequentemente, filhos), é preciso casar-se. Passar pelo crivo da Igreja. Estar inscrito em seus livros de registros. Depois de tudo isso, é permitido o casamento, o sexo, a procriação, etc. (preferencialmente nessa ordem).

Podemos imaginar que isso não acontece, que tudo é muito "liberal", que a juventude faz o que bem entende e ninguém ouve a Igreja. Entretanto, a forma como os jovens vivenciam a sexualidade é uma reação, em parte, ao poder do discurso da Igreja. Desde a mais tenra idade é inculcado nas crianças, de uma forma ou outra, as ideias distorcidas da Igreja sobre a sexualidade humana. A ideia de um deus invisível, que vigia e pune (ou recompensa) por cada ato praticado (ou não) vem tentando desenhar uma "moral" baseada na autorrepressão e na culpa. Note que esse discurso nem sempre é explícito. Não é exclusividade da Igreja, mas de uma ampla parcela da sociedade. Enquanto isso, a Biologia do ser humano real trabalha. Aos quinze anos, tudo o que um menino quer é experienciar o sexo, aquilo de que tanto se fala na TV, na escola, em casa e na Igreja. A mídia (que não perde nenhum nicho de mercado) atende a essa demanda produzindo e vendendo um sexo idealizado, indolor e inconsequente a um público que tem o sexo como algo moralmente inacessível. É esse sexo idealizado que o adolescente busca, justamente porque o sexo nas suas formas "reais" é, ainda, socialmente reprimido.

Muitos pais, ao perceberem (conscientemente ou não) que foram "engambelados" pela Igreja, e que passaram metade de suas vidas culpando-se por crimes que não cometeram, agora tratam de "dar" a seus filhos uma educação exatamente oposta àquela que receberam. Liberalismo total. São os extremos interagindo?... É só uma impressão minha...

Um dos desafios da Igreja para este milênio é, justamente, controlar essa "liberalização" da sexualidade. Mal sabe ela que suas próprias doutrinas são responsáveis por boa parte do que Dom Dadeus chama de "liberalização". Numa passagem mais polêmica da declaração do arcebispo de Porto Alegre, ele faz a seguinte afirmação: "Antigamente não se falava do homossexual. E [o homossexual] era discriminado. Quando começaram, ‘olha, eles têm direitos de se manifestar publicamente'... daqui a pouco eles vão achar os direitos dos pedófilos" (Portal G1 - 05/05/2010). Só faltou dizer que hoje deveria haver mais discriminação.

Isso deveria dirimir quaisquer dúvidas que restassem quanto a Igreja ser uma instituição, no mínimo, preconceituosa (há quem prefira outros adjetivos...), burra (porque mistura "opção" ou "orientação sexual" com patologias, e acima de tudo, desumana. Uma instituição que nega a sexualidade humana, muitas vezes manifestadamente presente em seu próprio seio, pode ser humana? Uma instituição que tenta a todo custo criminalizar o uso de preservativos (que em certos lugares é o único recurso disponível na luta contra a AIDS) pode ser humana? Uma instituição que orienta seus seguidores a acreditarem que a "verdadeira" vida vem somente depois da morte, pode ser humana? Realmente, a Igreja não é uma instituição humana. É Divina!






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