sexta-feira, 8 de março de 2013

Foda-se, essa merda!


Há muito me parece que não há nada mais contemporâneo do que o ato de tocar o foda-se. Tanto que deveria existir um verbo novo, específico, que resumisse em uma palavra apenas esse tão preciso e atual gesto. Ao invés de dizer que fulano “tocou o foda-se”, poderíamos utilizar outro verbo, como, por exemplo, fulano “desempapou-se” (calma, eu já explico).

Acontece que desempapar-se pode ser compreendido mais ou menos como o contrário de empapar-se (embeber-se, ensopar-se, mergulhar-se em líquido...). Se pensarmos na sociedade líquida de Bauman, isso faz até certo sentido, uma vez que o modus operandi do “tocar o foda-se” tem certa relação com o excluir-se (ou tentar excluir-se) de certo conjunto de valores e operações dos quais se espera que determinadas ações produzam determinados resultados.

Na prática, tocar o foda-se consiste em colocar um ponto final nas dúvidas transitórias suspensas, dar a tarefa por concluída, afastar-se da situação-problema e, de longe, observar o estouro-resultado (afinal, o show não pode parar).

E foi exatamente o que o Papa fez. Ele desempapou-se. Incapaz de consertar aquele antro de corrupção, putaria e iniquidade que é a Igreja, ele decidiu que não queria mais nada com aquela bagaça, e declarou que está velho demais para essas coisas e que vai passar o resto de seus dias dedicando-se a escrever livros.

(Como se não bastasse, antes mesmo de vermos sair qualquer fumaça, branca ou preta, um dos cardeais que participaria do conclave assumiu que teve “atitudes impróprias” com seminaristas e também “largou pras cobra”. Pois é, pois é , pois é...)

Evidente que nem o cardeal nem o ex-Papa (é assim que se diz?) vão deixar de ser fiéis católicos que rezam e pedem perdão a Deus todas as noites por seus pecados, assim como aquele que entrega o relatório feito nas coxas ao chefe também não vai deixar de ser um bom colaborador da empresa.

Tocar o foda-se é uma arte, que deve ser exercida com cuidado e responsabilidade. Deve ser feito quando você é constrangido a fazer algo que você sabe que não vai dar certo (e cuja argumentação em contrário jamais funcionaria devido às ridículas estruturas hierárquicas) ou quando não existe outra alternativa. Não deve ser exercida em qualquer momento ou ocasião, mas somente quando é evidente que os esforços serão enormes e os resultados pífios. A vida é curta demais para esforços hercúleos que não trazem resultados. A vida é curta demais para os teatrinhos, para os faz-de-conta, para deslocar exércitos com o objetivo de masturbar um general. Mas como você é um soldado e tem que marchar (pois o general precisa ejacular) então foda-se! Vamos marchar! Conscientes, porém, do objetivo principal e do resultado. Aquele que faz o que está além do seu dever e antevê a desgraça que está por vir, o faz sob inspiração do foda-se, e, por isso, jamais chorará ao final. Passará pela sarça ardente sem se queimar e servirá de exemplo para os demais soldados, até que um dia, talvez, todos aprendam a masturbar-se sozinhos e não haja mais generais.

Tocar o foda-se tem a ver com limites. Ao contrário do senso comum, a minha concepção de limite tem a ver com algo insuperável, muito próximo ao impossível (o limite só não é igual ao impossível porque permite ao vivente a chance de tentar superá-lo). As pessoas devem estar conscientes dos seus limites. As pessoas que comandam as outras devem pensar nisso mais ainda, pois, além de lidar com seus próprios limites, deve conhecer e respeitar os limites da equipe sob seu comando. Quem tenta superar seus limites está sujeito à frustração e tocar o foda-se é a salvação de quem não tem outra alternativa.



Bem-aventurado o líder capaz de tocar o foda-se. Este será exemplo, seus descendentes cantarão as suas vitórias e seus erros não se repetirão.



Nesse sentido, o leitor atento certamente já percebeu que em momento algum eu denigro a atitude do Papa. Apesar do tom jocoso e despudorado dos meus escritos, no fundo eu admiro muito a atitude de Bento XVI. Ao menos ele teve a presença de espírito de praticamente dizer “não, isso não é pra mim”. O representante de Deus na terra, detentor da infalibilidade papal, cansou-se daquilo, atirou o chapéu num canto e foi fazer outra coisa. Com o aval de Deus “desempapou-se” de muita lama, de muita sujeira e deixou o troninho de ouro para outro machão qualquer tentar dar um jeito naquela joça. Enfim...

Observado por esse viés, tocar o foda-se torna-se uma excelente válvula de escape. Poupa as pessoas de desgastes desnecessários, evita a criação de inimizades e atritos inúteis e, sobretudo, exercita a criatividade.

Sejamos, pois, ferrenhos defensores dessa arte. Desempapemo-nos como fez Bento XVI, mas de forma melhor, mais alegre, menos disfarçada e sem hipocrisia.

Se você gostou desse texto, compartilhe, curte, coise, enfim... se não gostou, foda-se. Mas não deixe de comentar aí em baixo, mesmo que for para xingar. Até a próxima!

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