domingo, 4 de setembro de 2016

Ponto de virada

Ponto de virada pode ser qualquer coisa que marque uma mudança importante no rumo da vida ou na maneira como a vemos (ou as duas coisas juntas). Geometricamente falando, o ponto de virada (ou guinada) sugere que a mudança de direção ou do olhar se dê em qualquer ângulo, de uma simples correção de trajetória a um “meia volta, volver” seco e inesperado.

De certo modo, o início deste blog em 2009 se deu sob uma espécie de ponto de virada. Auge da faculdade de Letras, descoberta de autores e ideias inimaginavelmente insanos (lê-se fodas) para mim à época e, mais, de colegas e amigos, pessoas, gentes de carne e osso e cérebro, e de almas assustadoramente livres com as quais eu jamais havia topado nesse meio-de-mato bairrista e maniqueísta que, em linhas gerais, era (e É, salvo exceções) a Barbos Carcosa dos anos 2000.

A maioria dos textos (os de opinião, ao menos) seguiam um ritmo frenético, violento, de ironias e sarcasmos feitos propositalmente para ferir (por que não?) alguns baluartes do conservadorismo e deleitar meus ¾ de dúzia de fiéis leitores de então. Houve quem visse humor naqueles textos, mas provavelmente era só um tipo diferente de desespero.

Mas, buenas, tanto faz... Isso foi lá por 2009. Depois o ritmo acalmou, os assuntos não me tocavam mais e a ascensão do YouTube acabou por esvaziar de vez o pouco de gente que havia produzindo conteúdo no blogger e no wordpress. Sobraram somente os perfis mais profissionais e todo o resto caiu no mais insólito abandono da noite para o dia. Hoje resta somente um ou outro maluco que ainda alimenta seus blogs, escondidos lá nas profundezas da web, onde há tempos o Google perdeu o interesse em buscar o que quer que haja lá embaixo. Perdemos para a bolha da Internet. Você nunca mais vai encontrar algo interessante por acaso.

A “blogosfera” virou o reduto dos introvertidos (e egocêntricos também, vá lá) enquanto extrovertidos (e também egocêntricos, vá lá 2) pavoneiam-se no YouTube. E há gênios e idiotas nos dois times, acredite. O leitor que decida onde me encaixar.

Mas ainda não chegamos no ponto de virada.

O ponto é a resposta para a seguinte pergunta: por que diabos você vai voltar a falar sozinho nesse blog depois de mais de três anos de abandono? E a resposta é: eu não faço ideia. Ou, para ser mais bonito, podemos citar Renato Russo: “Alguma coisa aconteceu, do ventre nasce um novo coraçãããooooooo... Não penso em me vingar... blá, blá, blá...” (vocês gostam de citações, né?).

Talvez tenha a ver com a Casa dos espíritos, de Isabel Allende, que eu li há alguns meses. Talvez a ideia de escrever para leitores-fantasmas (como Clara fazia em seus “cadernos de anotar a vida”) tenha ficado no meu inconsciente, e vindo à tona com essa questão toda do golpe pelo qual estamos passando. Porque, sim, tenho quase certeza que ninguém vai acompanhar esse blog, exceto fantasmas.

A vantagem de escrever, (e, sobretudo, escrever para fantasmas) em vez de se expressar pelo YouTube, é que você pode desnudar sua alma com muito mais tranquilidade. Veja bem: até aqui foram 2987 caracteres distribuídos em 518 palavras, e posso afirmar com certa segurança que é possível confiar minimamente em quem dedicou seu tempo para ler tudo isso. E quem escreve por amor simplesmente confia em quem lê quase 3000 caracteres numa madrugada de sábado, sobretudo nesses líquidos anos 10 do profeta Bauman, de apelos visuais extremos e glórias instantâneas. Em outras palavras: vá desnudar sua alma no YouTube, depois me conte como foi.

Talvez essa seja a graça da coisa: se você ler 50% do que um autor qualquer escreve, você provavelmente o conhece melhor do que sua própria mãe! Se você ler 100% do que ele escreve, vai conhecê-lo melhor do que ele mesmo! Agora perceba: as coisas ficam terrivelmente mais interessantes quando seus leitores são fantasmas!

Então, para meus queridos gasparzinhos, as coisas vão funcionar assim: voltaremos a alimentar o blog. Entretanto, deste ponto em diante, ficarão de fora os textos de opinião. Volta e meia teremos alguma resenha de livro, filme ou o diabo, além de groselhas e tranqueiras, e os versos, reversos e remorsos que meus demônios julgarem importante deixar registrado em algum lugar mais nobre do que portas de banheiros.

Do lado de cá da web vamos tentar fazer melhor, porque desse ponto em diante É SÓ LADEIRA ABAIXO, amigos! E se você, querido leitor-fantasma, me encontrar na rua e tiver lido ao menos 50% do que eu deixei aqui, por favor, me conte quem eu sou! 

3 comentários:

  1. Muito bem! Adorei o texto! Espero que não tarde a escrever novamente! Abraços gasparzinicos

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    1. Obrigado, querido(a) anônimo(a)!

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    2. Obrigado, querido(a) anônimo(a)! A casa é sua. Assombre à vontade!

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