sábado, 24 de setembro de 2011

Documento antigo atestando a criação do mundo

Por meio deste, determino que:
pendurem-se as estrelas no céu
(e que sejam eternas, para o desepero do homem).
Armem-se de chuva as nuvens
e amarrem-se os frutos às árvores
(para o desepero dos que comem e bebem e nunca se saciam).
E que os macacos - ah, os macacos...
Que macaqueiem, macacos,
de mar em mar
(de bar em bar),
sempre rumo ao abismo
- à saída sem saída -
ao mérito pútrido dos nobéis 
e das marés das descobertas salvadoras 
(redentoras dos homens), das nações (e suas sanções).
Macaqueiem de norte a sul, 
de leste a oeste cowboy bandeirante errante, 
a passo largo e trôpego. 
Macaco trapezista, equilibra-te.
Equilibra-te pois no mundo, 
este lago insano-imundo.
Equilibra-te pois no muro
e mete no mastro tuas bandeiras
de cores mortas e estrelas rotas.
Equilibra-te pois no galho da tua própria loucura
(sem cura) e aguarda trêmulo, sim, 
o instante fatídico da ruptura, quando, enfim, 
tornarás à matéria pura.
Faça-se assim o mundo
(num instante), num segundo de olhar para o lado...
... e remeta-se cópia ao diabo.

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Aniversário de sete mil anos da melhor cidade do mundo

Parabéns!

Parabéns, cidadinha circense, pelo mais do mesmo de sempre, que muito tem contribuído para o desenvolvimento da nossa apeculiar cultura de homens-carro movidos a álcool e minissaias. 
 
Parabéns, cidadinha circense, pelas falanges e horas amputadas por tornos e prensas em favor do diabo. 

Cidadinha querida que me deu ao mundo, obrigado por tudo - pão e trabalho.  (Ó trabalho! Sagrado trabalho! Com as facas que eu mesmo afiei, arrancou-me os olhos que (o que foram eles, janelas da alma!) jogados no lixo das vitrines em Full-HD, fulminam agora meus pensamentos com ânsias de pulsos cortados - cordão umbilical da morte.) Parabéns, cidadinha circense-nonsense - que é tão virtuosa, mas (sobretudo) dolorosa! Parabéns! Avante! Estamos no caminho certo que Deus prometeu numa manhã calma de domingo com maçãs e vizinhas e pecados. Avante! O passado é logo ali (e não olhe para os lados)!






sexta-feira, 2 de setembro de 2011

A institucionalização da demagogia

Quem acompanha este humilde blogue já deve ter observado que o objetivo do Macaco Escrevedor não é falar sobre política, necessariamente. Esse espaço não é um sítio de propaganda ou publicidade de qualquer coisa (pelo menos não conscientemente). É um espaço onde procuro compartilhar com amigos algumas parcas experiências literárias e algumas opiniões pessoais sobre um ou outro assunto, tudo dentro do espírito despretensioso e consciente de um personagem símio que sabe que o universo não mudará um átomo sequer de lugar independentemente do que aqui seja escrito, lido, comentado ou compartilhado. Mesmo assim, porém, não pude resistir e deixar de transmitir as minhas impressões sobre os últimos acontecimentos de Carlos Barbosa, desta vez, especificamente político-partidários. Os leitores que não veem atrativo nesse tipo de texto, se quiserem, podem pular daqui para o próximo site. Estarão desculpados. Aos desocupados que optarem pela aventura, é necessário esclarecer que trata-se de um assunto local, que certamente soará estranho e incompreensível ao leitor fora do contexto barbosense das últimas semanas (nossa, parece que eu tenho muitos leitores). Mesmo assim, aos que optarem por prosseguir, dedico os versos do poeta vermelho: “sigam-me os bons!”.

Há alguns dias a imprensa local decretou que Carlos Barbosa estava passando por um momento histórico (a ampliação - sem aumento de custos - do Legislativo). Também foi decretado que 90% da população era contrária a esse acréscimo no número de vereadores (com redução de salário, repito, de modo a não ferir nosso sagrado hábito de não gastar dinheiro, do povo, porque, dizem, algumas empresas nem IPTU pagam) com base numa pesquisa feita com 30 pessoas (pesquisa mui científica, por sinal, que parece ter tido a pretensão de substituir o polêmico plebiscito que fora recusado noutros tempos). Reparem que, mesmo assim, eu não questiono o resultado da pesquisa. É muito provável que esteja próximo da realidade, embora não defina o quanto essa questão seja considerada mais ou menos importante que outras. Mesmo assim, o que chama a atenção é a forma como dados subjetivos se transformam em realidade objetiva. Foi decretado que essa era uma questão vital. Assim como foi decretado que um movimento (aquele que passou no Jornal do Almoço) encabeçado por pessoas, dentre as quais algumas filiadas a partidos específicos, é um movimento apartidário (reparem, outra vez, que não me refiro à parcela da população que aderiu ao movimento, se bem que boa parte dela também é partidária, ou simpatizante, participante de grupos de juventude de partidos, etc., o que não quer dizer que acho errado participar da política partidária - errado é estar filiado e esconder isso das pessoas). Foi decretado que o movimento era a voz do povo quando na verdade, o movimento e seus apoiadores políticos ou financeiros (ou ambos, não sei) apropriaram-se de uma informação do senso comum (e compreensível), que preza pela redução sistemática do aparato político, para iniciar uma campanha eleitoral antes mesmo de definidas as coligações. Reparem, mais uma vez, que isso não significa que o movimento não seja legítimo, no sentido de promover as mobilizações que quiser em defesa dos interesses que quiser (que coincidentemente são interesses do “povo”, como dizem, mas que só agora, providencialmente, vieram à tona, deixando passar outros momentos possivelmente tão desencadeadores de “indignação popular” quanto este) - significa apenas que o movimento não é tão “apartidário” como ele próprio se desenhou e quanto gostaríamos que fosse. Prova disso foi a sessão de quarta-feira, 31, que contou com a presença do "povo", sim, mas também com a presença maciva dos chamados CCs e FGs, filiados, simpatizantes e eleitores dos vereadores decretados “favoritos”. Quem esteve lá viu o “povo” aplaudir entusiasmado o vereador Rafael Dalcin quando o mesmo, num momento de audácia poética, construiu uma metáfora aproximando a ampliação do Legislativo (sem aumento de custos, insisto) com a imagem de uma família que, para receber duas pessoas a mais, precisa comprar panelas maiores (uma metáfora que eu considero ridícula e totalmente inapropriada para a complexidade do tema e dos interesses em questão, com todo respeito ao vereador Rafael e seus eleitores) enquanto os outros dois vereadores (também contrários à proposta) mal foram ouvidos, embora tenham oferecido falas tão ou mais consistentes do que aquela.
Enquanto isso, num passeio pelo Facebook, verifiquei que chovia declarações de alguns dos idealizadores do Movimento a Voz do Povo dizendo que “no ano que vem eu sei em quem não votar”. Tais afirmações, nesse contexto, quando ditas por pessoas sem vínculos partidários, me deixa feliz, pois, ao menos, aquela pessoa parece que decidiu acompanhar a vida política do seu município (mesmo que de forma primitiva, já que é infantil escolher em quem votar ou não baseado apenas em UMA questão). Mas quando esse propagandeamento (“agora eu sei em quem não votar”, por exemplo) sai da boca de uma pessoa filiada (que justamente por estar filiada sempre soube em quem não votar, pressuponho) e que, além disso, é um dos responsáveis pelo tal “movimento apartidário” fica mais do que claro, para mim, que a intenção vai muito além de se manifestar contra essa querela de 9 ou 11 vereadores (que não vai aumentar os custos, falei de novo, e que teoricamente poderia ampliar a precária força do nosso Legislativo que, normalmente, é visto como um poder que deve subordinar-se ao Executivo, embora esse seja um assunto à parte do que eu quero expor aqui).
Considero que havia barbosenses que estiveram lá desvinculados de funções públicas e partidos, e respeito, inclusive, os partidários que estiveram presentes e que não escondem de ninguém a que vieram e a quem apoiam (ao contrário do que acontecia nos “pseudo-debates” no meio eletrônico, onde a pessoa que declarava sua posição contrária e a defendia com argumentos, ou que simplesmente apontasse o vínculo partidário de algum dos organizadores do movimento era frequentemente excluída da lista de “amigos” do movimento e o tópico em questão providencialmente deletado). Por tudo isso deixo a questão: O movimento (não as pessoas - o movimento) que aplaudia o vereador Dalcin a cada mexida de bunda na cadeira, mas mal dava ouvidos aos demais, e que fazia questão de vaiar o Andrade, somente o Andrade, era apartidário?
Quero aproveitar a oportunidade para exercitar minha mediunidade. Posso prever que, nesse sábado, para os outros 24 mil barbosenses que não puderam, não conseguiram ou não quiseram acompanhar o decretado “momento histórico” haverá um prato feito preparado pela nossa imprensa decretando que “o povo deixou de lado as convicções políticas e se fez presente”, decretando que “os vereadores foram insensíveis ao gritos de dor da população”. Que se fizeram presentes jovens, crianças, aposentados, professores e metalúrgicos (esses últimos nem preciso dizer com que objetivo seriam citados). Será decretado que toda a parcela consciente da população estava lá e que as únicas pessoas com vínculo político participando da manifestação eram os favoráveis à ampliação (que serão descritos como tolos ou comprados, provavelmente).
Tenho certeza que muita gente vai dizer “eu estava lá e não sou CC nem filiado”, ou “eu ganho FG mas isso não me impede de ter minha opinião”. Parabéns, então (se não for mentira, como também já aconteceu). Parabéns e volte sempre à Câmara. Parabéns e não cometa o erro de avaliar seu candidato em 2012 apenas por uma noite de empulhação e de provocações pessoais, aquelas às escondidas, que só se faz na segurança da "multidão". Parabéns e preste atenção em quem apoiou esse movimento. Preste atenção em quem será sempre vaiado pelo movimento. Acompanhe o processo daqui para frente e tente descobrir a quem o movimento serviu (além do "povo", sim), mas a quem ele serve e servirá daqui por diante debaixo do pretexto de “dar voz à população amordaçada”, como se ninguém estivesse ciente do que a população em geral pensa sobre política (mas sobretudo do que outras categorias pensam sobre política). Não tenho dúvidas do que The Movement atira num alvo para acertar em outro.
Só agora entendo o significado da expressão “em política vale tudo” (e eu pensando que falavam de mortes encomendadas, como acontece às vezes em alguns estados, nunca aqui, obviamente). Mas nunca imaginei que o “vale tudo” seria desse jeito, o que mostra o quanto eu sou aventureiro nesse assunto.
Por falar em vale tudo, assistir àquela mulher (é melhor eu não adjetivá-la) dizendo que não vale a pena aumentar o número de vereadores porque “são só mais dois pra roubar o dinheiro do povo” foi quase mais trash do que o dia em que eu procurei 2 Girls 1 Cup no Google (trash como a RBS, que não perde a chance de reduzir assuntos complexos a uma frase burra e de fácil assimilação e repetição). Não vou falar mais nada, só deixar registrado que me intrigou muito a RBS dedicando espaço da programação para um grupo “apartidário” que coletou mil assinaturas que, por falar nisso, deveriam passar de duas mil, no mínimo, já que o povo estaria tão ferido e revoltado como foi decretado. A RBS poderia poupar seu público de assistir a uma cena tão parca como aquela, no entanto, gravou e levou ao ar a “opinião” mais tosca que eu ouvi até agora ao longo dessa discussão. Essa postura imbecilizante da emissora sempre me faz ter a impressão de que há um objetivo claro por trás dessas “notícias”, mas, como diria o De Assis, esse assunto é galho pra outro macaco. Ou para outra sexta-feira.
Moral da história:
1) as palavras não servem para nada (ou para pouca coisa) uma vez que tenho certeza que pouca gente vai entender realmente o que eu pretendi expressar (isso já foi analisado aqui);
2) a história do mundo se faz por meio de decretos, onde um evento qualquer, testemunhado por uma centena de pessoas é (será) retransmitido para o mundo com o tom e as cores que o transmissor quiser dar, junto com o decreto do que aconteceu, que, via de regra, será reduzido a uma narrativa simplista dos fatos, pra não dizer burra;
3) a campanha eleitoral (ou contra-campanha, ou algo parecido) em Carlos Barbosa começou cedo, antes mesmo da definição das alianças partidárias, tendo como braço direito de um grupo político um movimento que já foi decretado apartidário, e que (já posso prever) estará sempre promovendo manifestações quando o assunto interessar ao povo a algum grupo político específico, o que já está dando mostras de acontecer;
4) em 2012 boa parte do debate eleitoral (senão a principal) irá gravitar em torno da ampliação do Legislativo, mas não pelo viés econômico, que diz que a população foi prejudicada (porque não foi), mas pela lógica maniqueísta que resume tudo a um jogo de mocinho e bandido, em que esses últimos serão os que não ouviram a “vontade do povo”, de modo que, novamente, toda a complexidade do jogo político e seus mecanismos de disputa de poder (que é o que se chama política, afinal) não estarão, como sempre, ao alcance da apreciação do sempre bajulado "povo" que, antes de mais nada, dadas as regras do jogo, é tido pela sua função (nesse instante) dentro do sistema: a de eleitor - cuja vontade é a mesma vontade de outros partidos, mas defendida por estes por motivos bem diferentes, e devidamente afastados do debate; mandando assim pelo ralo todo o conjunto dos trabalhos no Legislativo desenvolvidos ao longo de quatro anos, resumindo tudo a uma única e simples tarefa: lembrar de quem, como foi decretado, não merece mais ser vereador. Uma simplificação muito adequada para conquistar o carinho de um eleitorado distante que, talvez, antes da última quarta-feira, nunca havia colocado os pés na Câmara. E ainda não colocou.